
Seminário sobre prevenção e combate às práticas sócio-culturais nocivas à criança encerra com aprovação da declaração de compromisso dos participantes

Encerrou no dia 18 de Agosto de 2017 em Quelimane, o seminário provincial sobre prevenção e combate às práticas sócio-culturais nocivas à criança que teve a duração de dois dias e decorreu nas instalações da Direcção Provincial de Economia e Finanças da Zambézia, cuja abertura oficial foi dirigida pelo Governador da província da Zambézia, Abdul Razak Noormahomed.
O evento que juntou mais de 40 participantes oriundos de 22 distritos da província central da Zambézia, entre cônjuges dos administradores distritais, líderes comunitários e religiosos, membros do Governo Provincial, matronas e mestres de ritos de iniciação, deputados da Assembleia da República, parceiros e órgãos de comunicaçao social, caracterizou-se por painéis de debates, reflexões em grupos e discussões em plenária.
O seminário provincial sobre prevenção e combate às práticas sócio-culturais nocivas à criança que decorreu sob o lema “Diálogo de mulher para mulher”, reflectiu sobre a problemática da violência contra a criança na província da Zambézia, discutiu sobre o papel das mulheres na protecção e promoção dos direitos e bem estar da criança e permitiu também dotar aos participantes de conhecimentos sobre os direitos sexuais reprodutivos das raparigas e mulheres bem como, reforçar o conhecimento dos participantes sobre o papel da família na reintegração social de crianças vítimas de violência.
A Gestora sénior de Advocacia e Campanha da World Vision-Moçambique, Persilia Muianga de Gouveia disse que é importante que a família saiba que tipo de chá está a preparar para os seus filhos. Segundo ela, se o chá for temperado com o sal naturalmente que vai ser salgado e se for muito forte, de certeza que irá provocar problemas de saúde.
“Então temos que saber que tipo de chá estamos a preparar para a nossa criança, porque depois dela tomar, vai-se reflectir no seu comportamento, habilidade e atitude. E se olharmos para as funções que uma família deve exercer, vamos perceber que ela para ser funcional não basta ter mãe e pai em casa. É preciso que se estruture de modo a criar espaços para que as crianças possam realizar os seus direitos e sejam capacitadas para aprender a se tornar adultos e cidadãos responsáveis”. – Observou Persilia Muianga.
Na generalidade, os intervenientes do seminário foram unânimes em referir que Moçambique tem uma legislação e políticas públicas que promovem a defesa da igualdade de direitos entre todos os seres humanos, seja qual for a idade, o sexo, a religião e grupo social a que pertencem.
Também realçaram nas suas intervenções que o Estado e as organizações da sociedade civil que trabalham nas comunidades têm desenvolvido acções de formação e de divulgação das leis, com o objectivo de que, mesmo nas zonas mais afastadas das cidades e das vilas, todos moçambicanos tenham o mesmo conhecimento sobre a Lei e possam aceder, de igual modo, aos seus direitos.
Destacaram o facto da Lei ser aplicada, independentemente do lugar e do grupo etnolinguístico dos cidadãos do país.
Contudo, no que diz respeito às crianças e jovens, os interlocutores observaram que estudos realizados mostram que algumas tradições continuam por vezes, a influenciar de forma não positiva, o exercício dos seus direitos.
Tendo-se sentido a necessidade de estudar práticas culturais que possam estar a impedir a igualdade de direitos humanos, foram realizadas algumas pesquisas sobre os ritos de iniciação.
Segundo os interlocutores, entre várias questões abordadas nessas pesquisas, dão conta que os adultos, em geral, e os homens em particular, têm mais acesso a direitos que as crianças e mulheres.
Quanto à gravidez, as pesquisas mostram que só é considerada ilícita pelos mestres, matronas e lideranças comunitárias, se ela acontecer fora do controlo da família. Isto significa que, se as famílias “csarem” as filhas com um homem, mesmo tendo elas 13 ou 14 anos e eles 40 ou 50, a situação é considerada normal e a gravidez prematura é aceite.
De acordo com os intervenientes, o que as pesquisas tornaram evidentes é que há ainda uma tentativa de transmitir a ideia de que os ritos de iniciação são factores importantes de educação, tendo em conta que mulheres e homens são diferentes e têm direitos e deveres diferentes.
Ora, esta maneira de ver, segundo eles, contraria todo o trabalho que o Estado e as organizações da sociedade civil estão a fazer nas comunidades.
Esta situação, segundo os interlocutores, gera conflitos entre a Lei e a aprendizagem realizada na escola e as práticas culturais que procuram conservar tradições questionadas pelos novos contextos.
Para os intervenientes do seminário, as soluções para reverter a actual situação passa necessariamente por garantir uma educação para raparigas e rapazes, eliminar as barreiras que impedem a participação da mulher em condições de igualdade na vida social, cultural, económica e política, envolver os jovens e os homens na luta pela igualdade, realizar campanhas de mobilização social para criar consciência e aplicar direitos humanos internacionalmente acordados, incluindo o direito a saúde reprodutiva.
Foi de consenso entre os participantes do seminário, que ao regressarem às suas proveniências, fossem agentes activos de divulgação e também de denúncia da violação dos direitos das crianças, particularmente dos “casamentos” prematuros.
Entretanto, a Embaixadora da World Vision-Moçambique para o Bem Estar da Criança, Eunice Andrade, convidou a Esposa do Governador da Província da Zambézia, a Professora Emília Noormahomed para apresentar a declaração do seminário.
Tomando a palavra, Emília Noormahomed disse que depois de dois dias de debates e troca de experiências, estavam próximos do auge daquele seminário que teve uma participação massiva e heterogénia, de vários actores da sociedade moçambicana, o que segundo ela, demonstra que realmente o tema que lhes trouxe ali, é de grande importância.
E antes de apresentar a declaração de compromisso do seminário, a Esposa do Governador da Província da Zambézia agradeceu a todos presentes pela sua participação e desejou-lhes um óptimo regresso para os lugares donde vieram e, para os residentes da cidade anfitriã, renovou a promessa de continuarem a trabalhar juntos para a eliminação da violência contra a criança.
“Nós mulheres e homens da Zambézia, comprometemo-nos em disseminar e replicar nas nossas comunidades, as experiências adquiridas neste diálogo ‘de mulher para mulher’ para garantir a eliminação de todas as formas de violência contra a criança.
Neste sentido, iremos trabalhar para adesão da rapariga na escola, denunciar às autoridades, todas as formas de violência contra a criança que formos a constatar nas nossas comunidades.
Sensibilizar as famílias para que não permitam casamentos prematuros dos seus filhos, persuadir as matronas e mestres de ritos de iniciação para observarem as fases adequadas às idades das crianças.
Acordar junto das autoridades, para disseminação e operacionalização das leis sobre a protecção da criança, ao nível das nossas comunidades.
Massificar a divulgação das leis de protecção da criança ao nível das nossas comunidades e, em línguas locais, como forma de garantir maior protecção junto delas.
Consciencializar as comunidades sobre a violência contra a criança, bem como sobre as consequências nefastas dos casamentos prematuros e gravidez precoce na saúde e desenvolvimento das crianças.
Criar e consolidar parcerias nas organizações não governamentais nacionais e internacionais, sector privado, sociedade civil e comunidade académica com vista a garantir a continuidade e sustentabilidade das acções que tem sido promovidas no seio das comunidades para o bem da criança assim como a réplica de fóruns desta natureza ao nível dos distritos e localidades, envolvendo líderes comunitários e religiosos.
Promover a iniciativa da educação da rapariga, dotá-las de capacidade de tomada de decisão sobre os seus direitos sexuais e reprodutivos.
Ser agentes activos no processo de mudança de comportamento nas nossas comunidades respeitando e preservando os valores sócio-culturais que não se afigurem nocivos no desenvolvimento pleno da criança.
Nós, mulheres e homens da província da Zambézia, reiteramos o compromisso de reunir esforços e sinergias para contribuirmos na eliminação de todas as formas de violência da criança, incluindo os casamentos prematuros nas nossas famílias”.
Após a leitura da declaração de compromisso do seminário pela Esposa do Governador da província da Zambézia, este documento foi aprovado por unanimidade dos participantes.
Por seu turno, o Director provincial de Cultura e Turismo da Zambézia, Amostra Sobrinho, ao proferir o seu discurso de encerramento oficial do seminário agradeceu em nome do Governo pela abertura e ricas contribuições dadas pelos participantes, na procura de soluções para eliminar todas as práticas sócio-culturais nocivas à criança.
Amostra Sobrinho referiu-se ao papel das mulheres na protecção e promoção dos direitos e bem-estar das crianças, direitos reprodutivos das raparigas e das mulheres bem como a importância da família na reintegração social de crianças vítimas de violência.
O Director provincial de Cultura e Turismo da Zambézia salientou que todas as práticas sócio-culturais nocivas têm contribuido para o aumento de abusos sexuais de crianças, gravidezes precoces, mortalidade materno-infantil, casos alarmantes de fístulas obstétricas, desistência nas escolas, danos físico-mentais emocionais, casamentos prematuros, aumento do nível de desnutrição crónica e violência doméstica.
“As práticas sócio-culturais nocivas têm um grande impacto psico-social negativo nas crianças pois contribuem para anti-socialização e falta de oportunidades de ascender na vida.
Na nossa percepção, é de vital importância a prevenção e a responsabilização dos violadores e de todos que têm infringido os direitos da criança.
Reiteramos a necessidade de adequar as práticas de ritos de iniciação por forma a colmatar os aspectos negativos que têm contribuido para o aumento percentual dos casamentos prematuros.
Nas nossas apresentações frisou-se que a família é o principal alcerce para a educação da criança. É na família onde se busca a afeição e se aprende o saber ser e estar por via de transmissão de hábitos e costumes da nossa tradição.
Ao regressarmos aos nossos postos, reiteramos o nosso comprometimento na divulgação das recomendações deste seminário firmando assim a nossa posição na vanguarda da luta contra a violência da criança, empoderamento da rapariga, mobilização e sensibilização comunitária”. – Concluiu Amostra Sobrinho.
Fonte: ICS